quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Mudança!

Quase todos nós temos algo que gostaríamos de ter feito. E não fizemos. Um plano mirabolante que tinha tudo para dar certo, mas que nunca tentamos. Aquelas idéias que parecem ótimas na mesa de bar e, como ratos sorrateiros, escondem-se nos porões no primeiro raio de sol. Eu quero ter um café, uma livraria, uma livraria com café ou um café com livraria. Eu quero ser médica. A melhor médica. Tenho uma amiga que quer ser repórter. Outra que ser ter um consultório odonto - psicológico. Amigos que querem uma família de dez filhos.


Conheço um monte de gente que desejava fazer mais do que já ousou fazer, mas em algum momento deixou passar a chance de recosturar seus sonhos com o fio do possível. Preferiu se deixar convencer de que ser adulto era assumir uma idéia de responsabilidade que excluía a possibilidade de se reinventar a qualquer momento. E isso é real: pode não existir amor para sempre, nem vida para sempre, mas descobri que existe desistência para sempre.
Eu vivo esse dilema, já faz algum tempo. E resolvi escrever essa história porque tive a ousadia de reinventar a minha vida. Não aos 15, mas aos 25. Eu rejeito aquilo que chamo de vida de... E se?


E se eu tivesse feito isso e não aquilo? E se eu tivesse tido coragem? E se eu tivesse me divertido? E se eu tivesse sido mais corajosa? E se eu tivesse amado mais? E se? E se? E se? Não há nada mais triste do que uma vida de “e se”?
Manaus é uma cidade perfeita. E não foi a toa que o destino quis que eu nascesse aqui. Essa cidade oferece a qualquer um uma gama de oportunidades além de ser coberta por um colar que gruda na alma da gente. A cidade vai muito bem quando chove e faz sol na medida certa para o calor que gruda na alma da gente. A cidade vai muito bem quando chove e faz sol na medida certa para o calor humano. Ou seja, viver aqui depende do imponderável. Ouvi de muitas pessoas que era preciso sair daqui para viver melhor e ser feliz. Mas foi aqui, no calor dessa cidade que eu descobri que viver e ser feliz são uma fonte inesgotável de prazer. Acalme-se estou apenas situando o contexto onde eu comecei a salpicar os primeiros ingredientes de minha utopia.


Eu gosto de estar com pessoas, de ver gente, de movimento. Não é uma regra absoluta, mas quase. Para que tentar algum lugar novo se Manaus é garantia certa de diversão.
Quem vive uma vida medíocre, um dia quer mudar. Ou finge que quer. Deixar a construção de uma vida é uma espécie de jornada de herói. Não sei qual é a estatística mas a maioria não sai do lugar.
Apaixonei-me pelo curso de Letras desde a infância. Declarava pequenos trechos de Castro Alves à Machado de Assis. Meu irmão dizia que eu era a verdadeira pílula falante. Ensaiei uma faculdade de Letras quando chegou à hora, depois larguei- a. Aventurei-me a tentar medicina. Não foi possível. Voltei ao curso de Letras. E tudo isso me pareceu bom. Mas bom engloba tudo o que está na medida do possível. Nesse período, eu via muitos amigos olhando desconsolados para as ruínas de seus sonhos. Mas eu sabia que não estava entre eles. O deles parecia ser um destino resolvido.


Até que tive uma idéia. Deixei o curso de Letras para sempre. Falei com uns amigos. Arranjei um emprego e decidida a trabalhar na área da saúde, comecei um curso técnico de enfermagem.
Conciliei o trabalho com o curso técnico. Descobri que nos anos anteriores eu tinha vivido como um parasita. oE ainda mais, paralelo a isso voltei a me preparar para o vestibular de medicina. É tão bom, colocar os pés no chão, redescobrir que existe uma vida muito melhor. E em vez de ficar só sonhando, como a maioria faz, eu fiz.
O meu projeto era trabalhar em algo que me desse prazer. Investir no curso técnico e após o término do curso, me dedicar a faculdade de medicina, e assim unir o útil ao agradável. Simples assim.
Virar a vida pelo avesso. Eu tinha acabado de inventar um filme para botar dentro da minha vida. Não fiquei só falando ou lamentando uma vida que se estreitava. Alarguei meu mundo com as mãos, a cabeça e a força de um desejo que não deixei morrer. Uma vez fiquei pensando como teria sido cada noite, quando tudo podia dar errado.


O que poderia passar pela minha cabeça enquanto lecionava em uma escola que só me fazia mal.
Quanto medo eu tive. Nem mesmo dinheiro havia para esse investimento. E se eu não entedesse a linguagem médica. E se tivesse um chato que azedasse o meu ideal tão prematuro? Tudo podia acontecer. Até mesmo dar certo.
E deu. Quem comprou a idéia também queria uma ponta nesse filme. Minha família, como sempre, por trás de tudo o que eu faço. A felicidade para mim é um conceito global, ou existe felicidade para todos, ou não existe felicidade.
Tudo se tornou tão melhor. A minha cozinha, onde aos domingos a minha família se reúne se tornou tão cheia de aromas quanto de histórias. As conversas entre panelas e tomates, carnes. E a luz dourada do fim do dia atravessando o vidro da janela para pousar sem pressa na tampa das panelas.


Cada um se tornou melhor a partir desse dia em que a vida finalmente cumpria a si mesma. Al mondo é o nome do melhor de todos os sonhos, porque é um sonho que deixou de ser. Não por desistência, a causa mortis mais freqüente dos sonhos, mas por coragem.
Depois que tudo dá certo, parece fácil. Mas a vida de todos se decide é muitos meses antes, quando a gente não sabe se vai dar certo. E mesmo assim percebe que a coisa mais inteligente a fazer é botar a cabeça no lugar antes que seja tarde. Eu não me arrependo de nada. Nem mesmo de ter tirado a cabeça do lugar. Toda vez que o senso comum achou que eu estava destrambelhando fui parar num ponto interessante da vida.


Eu não sabia de nada, mas tive certeza que fiz tudo para que desse certo.
Eu sou uma mulher que sonha com os dois pés metidos em sapatos interessantes, mas com os saltos bem fincados ao chão.
E com tudo o que sou mudei os rumos da minha vida. E segui em frente. Com a vista para o mundo. Quanto às coisas que não mais fiz, olhei bem fundo uma derradeira vez. E fiz uma busca do pedaço do planeta onde acordei na manhã seguinte.

Um comentário:

  1. legal o texto, mas me deixou a dúvida se vc conseguiu passar no vest de medicina.. agora pude saber o que aconteceu com vc no tempo q agente se distanciou.. adoro vc.. =D

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